Os trânsitos da dádiva: a troca de presentes e a ideia de reciprocidade entre cirurgiões plásticos e pacientes no escopo da medicina trans

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E-mail
cleiton.vieira@ufrn.br
Telefone
(84) 9812-4471
Docente responsável pelo evento
Silvana de Souza Nascimento
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Auditório / Sala / Outro local
https://youtube.com/live/TyWNVT4vTB8
O evento será gratuito ou pago?
Evento gratuito
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Sem inscrição prévia
Haverá emissão de certificado?
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Haverá participação de docente(s) estrangeiro(s)?
Não
Descrição

O Grupo de Pesquisa Cóccix – Estudos (In)disciplinares do Corpo e do Território, do Departamento de Antropologia, apresenta a palestra "Os trânsitos da dádiva: a troca de presentes e a ideia de reciprocidade entre cirurgiões plásticos e pacientes no escopo da medicina trans", do Prof. Dr. Francisco Cleiton Vieira Silva do Rego (PPGAS-USP/UFRN), que visa apresentar parte dos resultados de sua pesquisa desenvolvida no âmbito do Programa de Pós-Doutorado da USP, no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social e no Departamento de Antropologia da USP.

O evento será virtual com transmissão via Canal do PPGAS/USP no YouTube (Link de acesso: https://youtube.com/live/TyWNVT4vTB8) e, contará com mediação de Profe. Dre. Silvana de Souza Nascimento (USP) e com comentários para debate da Profa. Dra. Mónica Franch (UFPB).

Resumo: A partir de uma etnografia desenvolvida em clínicas de cirurgia plástica e hospitais na região de São Paulo com auxílio de entrevistas, interessa-me nesta comunicação observar como as cirurgias, no contexto de mudança de sexo/gênero biomedicamente assistida, implicam-se enquanto presentes através dos quais as pessoas estabelecem dádivas entre si. As cirurgias de redesignação sexual e de gênero, as quais têm como objetivo oferecer modificações materiais de significantes do corpo sexuado de alguém, são performadas atualmente no Brasil sob diferentes visões terapêuticas que concorrem entre si. Embora ainda não hegemônicas, algumas posturas afirmativas não têm concentrado suas atuações na busca pela figura do “transexual de verdade”, mas apoiar pessoas de diferentes performances e habitus eróticos em suas transições de gênero em diversas linguagens e práticas estatais e de mercado. Nesse sentido, assiste-se a um movimento de despatologização e de biomedicalização que transforma os lugares na diversidade sexual e de gênero no escopo médico. Enquanto uma transação comercial em forte crescimento em clínicas e hospitais privados, cirurgiões e cirurgiãs se multiplicam no país oferecendo operações que cobrem todas as cirurgias conhecidas no âmbito da medicina trans, e indicam novos lugares para as transexualidades no mundo social da medicina à brasileira: mamoplastia masculinizadora, mamoplastia de aumento, vaginoplastias, metoidioplastia, feminização facial, entre outras – as quais, por sua vez, unem-se a operações médico-cirúrgicas performadas em outros públicos, como harmonização facial, lipoaspiração, drenagem linfática, etc. Contudo, sob uma ótica comercial o pagamento e a oferta do serviço cirúrgico não podem ser vistos como uma relação monetária destituída de uma relação social que o extrapola. Ao observar práticas de propaganda on-line, cirurgiões e cirurgiãs expõem em suas redes sociais presentes que receberam de pacientes que operaram. Em uma visita aos seus consultórios é possível, ainda, notar boa parte desses presentes expostos como objetos de decoração em estantes e/ou sobre mesas que separam profissional e cliente: fotografias ao lado de pacientes operados em molduras de madeira e metal, miniaturas de médicos, bandeiras trans, cartões de agradecimentos, frascos de sal para afastar mau-olhado, chocolates. Em continuidade, pacientes divulgam em suas redes sociais fotografias e vídeos por meio dos quais se demonstram gratos e expõem a cirurgia como um presente. Assim, objetos materiais e emoções aí cristalizadas se colocam como dádivas que são trocadas entre pacientes e cirurgiões; se os últimos os expõem atualizando sua prática cirúrgica em notoriedade e eficácia, os primeiros demonstram a beleza e o bom resultado técnico marcados em seus corpos. Ao oferecer uma análise da cirurgia como um objeto que entra num circuito de relação de troca é possível observar como acontece a formação de pessoas na experiência cirúrgica da transição e como isso não implica uma destituição de posições de sujeito que são possibilitadas pelas condições sociopolíticas das quais partem. A troca monetária dinheiro-cirurgia pode ser entendida inaugurando um ciclo de dádiva que cria dívidas que são dadas e retribuídas em um contexto de difícil acesso a procedimentos cirúrgicos de mudança de sexo/gênero no país e da própria configuração social e política da relação médico-paciente. Isso leva, portanto, a uma reflexão sobre as operações simbólicas e políticas da ideia de reciprocidade num cenário comercial, de habitus corporais, de consumo e de afirmação identitária para a formação do campo da saúde e da medicina trans no Brasil.

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Cartaz do evento