Gustave Flaubert foi o fundador e principal representante do realismo francês
Nascido na França em 12 de dezembro de 1821, Gustave Flaubert se tornou reconhecido mundialmente por seu livro Madame Bovary. A obra, considerada como "romance dos romances", é pioneira entre os romances realistas e foi uma das muitas contribuições literárias de seu autor. Flaubert publicou mais de dez obras ao longo de sua carreira e morreu em 8 de maio de 1880, aos 58 anos de idade.
Para saber mais sobre Gustave Flaubert, confira a entrevista completa com o pesquisador Fillipe Augusto Galeti Mauro, doutor em Literatura Francesa pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP.
Serviço de Comunicação Social: Quem foi Gustave Flaubert?
Fillipe Augusto Galeti Mauro: Gustave Flaubert foi um escritor francês do século 19, importante representante da estética realista e do gênero de romance de formação. Notabilizou-se por romances como A educação sentimental, Madame Bovary, Salammbô, mas também por novelas como Um coração simples.
Serviço de Comunicação Social: Quais as principais características das suas obras e qual é a relação com o contexto da época?
Fillipe Augusto Galeti Mauro: "Era das revoluções" segundo o conhecido título do historiador inglês Eric Hobsbawn, o século 19 foi marcado por uma generalização da vida moderna e burguesa no continente europeu. A França, engendrada após o terror jacobino e o expansionismo napoleônico, é mais industrial e mercantil, seus espaços urbanos se expandem sobre o antigo campo rural. A criação de escolas normais eleva os índices de alfabetização, jornais e editoras se multiplicam, o francês impõe finalmente sua hegemonia sobre patois – línguas regionais, populares e essencialmente orais, de escasso registro literário –, como o bretão, o gallo, o occitano e o provençal. A proliferação não apenas de ferrovias, mas também de navios a vapor, pelos mares e pelos rios, vem coroar o processo e substituir a força animal, acelerar os deslocamentos de massas humanas. Essa profunda modificação das formas de vida, muito mais fluidas e móveis em um mundo que submete as relações à competição racional dos mercados, se frutifica em uma legião de novos personagens dignos da representação literária. Ganham direito à pena do escritor operários e domésticos, mascates e dândis, aristocratas e funcionários públicos, policiais e apaches, liberais e socialistas, burgueses e arrivistas, em Paris ou na província.
Flaubert foi o grande psicólogo dessa nova massa humana. Onde Balzac catalogou tipos sociais, à moda de um naturalista, Flaubert buscou o retrato de um tempo, a imagem do processo histórico que produz novas consciências, sensibilidades e moralidades. É o caso de Emma Bovary, jovem educada na leitura de romances, que sonha com uma vida mais aventureira que aquela de seu medíocre casamento, que se entrega a amantes, ao luxo supérfluo, mas que se arruina, se vê irreversivelmente aprisionada nos códigos de seu tempo e não encontra outra saída senão o suicídio. É o caso de Frédéric Moreau, também burguês interiorano, talentoso estudante em Paris, dominado pelo amor de uma dama casada, Madame Arnoux, em constante confronto e tensão com as convenções e mesquinharias da vida mundana, a tal ponto ponto que sepulta seu próprio ideal romântico.
Serviço de Comunicação Social: Quais foram suas principais contribuições? Como elas repercutem atualmente?
Fillipe Augusto Galeti Mauro: O estilo de Flaubert foi responsável por uma importante renovação da linguagem literária em língua francesa. Seu uso do pretérito imperfeito, não raro acompanhado do particípio presente (similar ao gerúndio português) introduziu dinamismo e movimento na representação do passado. Proust, que deve a Flaubert muito do efeito de passagem do tempo de sua obra, apelidou esse pretérito imperfeito de "eterno". Há igualmente em Flaubert uma cuidadosa escolha de preposições e de advérbios que serve à imagem de prolongamento dos estados de espírito dos personagens. O perspectivismo de Flaubert inaugura um importante veio estilístico que retrata o mundo objetivo segundo psicologias individuais, denunciadas por um demiúrgico narrador onisciente que a tudo vê e escuta. Encontraremos herdeiros do estilo flaubertiano não apenas na França, mas também no Brasil, especialmente no romance de Milton Hatoum.
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Fillipe Augusto Galeti Mauro possui graduação em Jornalismo (2014) pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. É doutor (2022) em Literatura Francesa pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, em cotutela com a Universidade de Paris III - Sorbonne Nouvelle. Atua nas áreas de Literatura Comparada, Literatura Francesa e Literatura Brasileira.