Seminário Internacional Brasiliana, Brasilianas: Colecionismo; Bibliotecas; Pesquisa; Identidades Nacionais

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bbm@usp.br
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Docente responsável pelo evento
Prof. Dr. Carlos Alberto de Moura Ribeiro Zeron e Profa. Dra. Iris Kantor (ambos do Departamento de História - FFLCH-USP)
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Evento online - Cana da BBM no Youtube (https://www.youtube.com/channel/UC4wTnSCEZxg9Q63uOjYGw6g)
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Descrição

Nos dias 08, 09 e 10 de fevereiro de 2022, a Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin realiza, em parceria com outras instituições, a segunda edição do "Seminário Internacional Brasiliana, Brasilianas: colecionismo, bibliotecas, pesquisa e identidades nacionais".

O evento virtual propõe uma reflexão sobre o efeito multiplicador das brasilianas em um mundo conectado e sobre as múltiplas relações que se colocam entre colecionismo, bibliotecas, pesquisa e identidades nacionais.

“A ciência de colecionar”, escreve Rubens Borba de Moraes, “consiste em saber quais os livros que estão desaparecendo e em comprá-los na hora certa”. A perspectiva do autor certamente faz coro com uma plêiade de colecionadores-bibliófilos do porte de José Mindlin, Mário de Andrade, Alberto Lamego, Paulo Prado e Félix Pacheco, para citar apenas alguns nomes de nossa cepa. É bem verdade que suas experiências em nada ficariam a dever às de outros bibliófilos, cujas coleções se converteram em bibliotecas reconhecidas, o que consagrou e perenizou o nome de seus patronos no mundo dos livros. Este é o caso da Bibliothèque Mazarine, em Paris; do Warburg Institut, em Londres; ou, ainda, da Herzog August Bibliothek, em Wolfenbüttel. A essas instituições, antigas livrarias particulares que se colocam hoje a serviço de leitores e pesquisadores de todo o mundo, devem-se somar as bibliotecas nacionais, na sua origem bibliotecas reais ou principescas enriquecidas por novos acervos e aquisições que se acumularam no fio dos tempos.

Notemos, portanto, que o ato de “comprar” um livro “na hora certa” adquire um sentido muito mais profundo, associado à própria ideia de patrimônio bibliográfico ou tesouro nacional. Noção que parece sucumbir à própria rotina das bibliotecas, empenhadas como estão em atender às exigências do público, as quais vão muito além ou aquém do ato da leitura e da pesquisa. Afinal de contas, como manter viva essa estranha “ciência de colecionar” diante de uma revolução informacional em curso, que coloca em xeque as funções dos antigos suportes e lugares da leitura? E se todos os livros do mundo pudessem ser acessados na tela de um computador, qual seria o sentido das bibliotecas? Na contramão daqueles que se colocam essas questões, cumpre observar que as universidades europeias têm investido pesadamente na construção ou ampliação de suas bibliotecas. Bibliotecas municipais e estaduais, tanto em países europeus quanto nos Estados Unidos, seguiram o mesmo movimento de ampliação, modernização e popularização de seus serviços. Por outro lado, a relação biblioteca-museu ou biblioteca-centro cultural se tornou uma realidade, talvez uma via menos catastrófica para se enfrentar o futuro.

Mas, sabemos que essas alternativas tocam apenas parcialmente as bibliotecas patrimoniais, destinadas à pesquisa. Por esse motivo cabe uma reflexão detida e plural sobre o sentido da relação que se estabelece, não raro como uma cicatriz de origem, entre colecionismo, biblioteca e pesquisa. As coleções especializadas originam-se num repertório selecionado pelo colecionador, com base em suas predileções pessoais, mas também de uma ciência e, como temos assumido, da noção de patrimônio ou bem cultural. Constituem exemplo de um corpus bibliográfico refletido, que atende à visão de mundo do bibliófilo tanto quanto a uma ideia de tesouro nacional, como é o caso das coleções brasilianas. O efeito multiplicador do termo Brasiliana se revela, nesse sentido, não apenas pelos traços distintivos que um colecionador impõe à sua coleção, mas também pelas diferentes formas de apropriação e de institucionalização do acervo.

Rubens Borba de Moraes, cuja coleção brasiliana integra o acervo da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM), definiu um conceito estrito de coleção Brasiliana, que seria formada por “livros sobre o Brasil – no todo ou em parte, impressos ou gravados desde o século XVI até o final do século XIX (1900 inclusive), e os livros de autores brasileiros impressos ou gravados no estrangeiro até 1808”. De maneira complementar, criou também o conceito de coleção Brasiliense, que seriam “livros impressos no Brasil, de 1808 até nossos dias, que tenham valor bibliofílico: edições da tipografia régia, primeiras edições por unidades federativas, edições príncipes, primitivas ou originais e edições em vida – literárias, técnicas e científicas; edições fora de mercado, produzidas por subscrição; edições de artista”. Ao redor e mais além desses livros, o casal Guita e José Mindlin também organizou uma importante e variada coleção de livros correntes – isto é, livros que não têm elementos claramente “bibliofílicos” – sobre o Brasil que extrapolavam livremente os marcos cronológicos postos por Rubens Borba de Moraes. O exemplo da Brasiliana de Guita e José Mindlin serve para ilustrar tendências mais recentes de ampliação do conceito de Brasiliana. Ele pode designar não só livros de alguma maneira raros e especiais, mas qualquer coleção relevante que registre e permita compreender o Brasil em seus mais variados aspectos.

Essa tendência se verifica sobretudo nas experiências de organização de acervos digitais, que permitem preservar, difundir e ampliar o acesso a coleções que documentam e pensam o Brasil. Dentre essas experiências, destacam-se as bibliotecas digitais da BBM e da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, além dos portais Brasiliana Iconográfica e Brasiliana Fotográfica, que reúnem obras de várias instituições. Seguindo critérios mais ou menos abrangentes, há dezenas de coleções de Brasiliana espalhadas pelo Brasil e pelo mundo.

Nesse contexto, de um colecionismo ampliado por via digital, mas que mantém um perfil marcado por um recorte nacional, cabe indagar, contudo, como tais coleções podem responder à demanda de pesquisadores que conectam espaços que transcendem territórios nacionais e visam temáticas que ultrapassam aquelas ligadas à construção da identidade e da memória nacional. Se a globalização antecedeu o Brasil e ainda resiste a que o país afirme a sua soberania e a sua identidade nacional, como situar, hoje, coleções de Brasiliana concebidas no modernismo de ‘22?

A segunda edição do Seminário Internacional “Brasiliana, Brasilianas” propõe uma reflexão sobre as múltiplas relações que se colocam entre colecionismo, bibliotecas, pesquisa e identidades nacionais. Afinal, hoje é possível admitir, com certa clareza, que são tantas as brasilianas quantas as identidades que se lhe acomodam. Mas, nesse universo múltiplo, cabe perguntar: qual o lugar da leitura e da pesquisa? A noção de identidade, patrimônio ou tesouro nacional pode ainda mobilizar novas políticas de aquisições e usos das bibliotecas? Antes mesmo que se pergunte para que servem as coleções e as bibliotecas, resposta que Rubens Borba de Moraes trazia de cor, inspirado em um poeta, o seminário busca reunir esforços para refletir sobre o efeito multiplicador das brasilianas em um mundo conectado.

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Brasiliana, Brasilianas