Filósofa Marilena Chaui é a nova professora emérita da FFLCH USP

Durante seu discurso de agradecimento, a docente também proferiu uma aula sobre autoritarismo, defesa da universidade pública e concepção da docência

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Eliete Viana
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A homenageada e professores da FFLCH
(Da esq.p/ dir) Os professores da FFLCH: Sérgio Cardoso, Maria Arminda do Nascimento Arruda; Marilena de Souza Chaui; Luís Sérgio Repa; Paulo Martins; e Maria das Graças de Souza (Foto: Fábio Nakamura / STI-FFLCH-USP)

 

Em sessão solene realizada no dia 13 de dezembro, às 14h, na Sala do Conselho Universitário, a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP outorgou o título de professora emérita a Marilena de Souza Chaui, do Departamento de Filosofia.

A cerimônia foi iniciada pela diretora da FFLCH, Maria Arminda do Nascimento Arruda, que lembrou que, há um ano, no mesmo lugar, a atual direção tomou posse oficialmente, e por coincidência ocorreu na mesma data da promulgação no Brasil do Ato Institucional número 5 (AI-5), que completa 49 anos.

Maria Arminda destacou a importância da homenageada.
“Marilena Chaui é uma das personalidades públicas mais marcantes da sociedade brasileira contemporânea. A Faculdade quando, justamente, a homenageia reafirma a sua vocação de Instituição que alia refinamento intelectual ao compromisso com os problemas do tempo, da sociedade brasileira e da agenda política”.

Em seguida, a professora emérita Walnice Galvão, e as docentes do Departamento de Filosofia Maria das Graças de Souza e Olgária Chain Féres Matos foram buscar a homenageada da tarde para acompanhá-la à sala do Conselho Universitário.


Orgulho

Após Marilena compor a mesa da cerimônia, o chefe do Departamento de Filosofia, Luís Sérgio Repa, falou um pouco do título outorgado. “Expressar o sentido deste título para o nosso Departamento e para a Faculdade não é uma tarefa fácil, dadas todas as suas contribuições a sua história, para o ensino da Filosofia, para a formação de pesquisadores e para a interpretação crítica do Brasil”.

Além disso, Repa comentou sobre o orgulho do Departamento em ter a nova professora emérita nos seus quadros. “Raríssimas vezes na história da academia brasileira um nome pode anteceder e transcender os muros da Universidade como fez o nome de Marilena Chauí. (...) Reunindo Filosofia e realidade brasileira, esta intelectual criou em muitos jovens o ímpeto para a Universidade e dá significado ao nosso ofício de professor de Filosofia”.


Saudação

Em nome da Congregação da FFLCH, a saudação à nova professora emérita da Faculdade foi feita pelo docente do Departamento de Filosofia, Sérgio Cardoso, com um relato da vida acadêmica e intelectual de Marilena, destacando a sua reinterpretação da filosofia de Baruch de Espinosa.


“Somos testemunhas, nossa professoram da força irradiante deste seu desejo de verdade e de liberdade. E somos também testemunhas de que a Filosofia nunca foi para a senhora uma profissão, associada a uma carreira. Sempre foi a paixão alegre de onde vem a sua força para as batalhas do intelecto e da vida. E queremos que a senhora saiba o quanto é estimulante, e edificante, para nós vê-la intervir e atuar na cena política, não apenas como cidadã ativa, mas como intelectual engajada e filósofa”, frisou.

O docente comentou as reações das pessoas às manifestações públicas da professora, “sempre fortes, desnudam as ideologias, revelam as contradições, iluminam a cada passo as questões controversas”, que segundo ele desperta o grande desejo de ouvi-la e também o de calá-la naqueles que “criam e manipulam evidências”.

Para Cardoso, a passagem de Marilena por órgãos de governo – o Conselho Federal de Educação e a Secretaria Municipal da Cultura de São Paulo, este último de 1989-1992 – será lembrada, acima de tudo, pela defesa intransigente da causa do ensino público e o aprofundamento de suas decisões reflexivas sobre a natureza da cultura popular e o exercício da cidadania cultural.

Ele chamou atenção para o número “espantoso”, segundo suas palavras, de teses e dissertações orientadas por Marilena. Cerca de 80 teses, 37 dos seus orientandos tornaram-se professores universitários, sendo 11 no Departamento de Filosofia da própria FFLCH, sendo o próprio Cardoso um deles.

E, para finalizar, Cardoso disse que o momento era para celebrar não só a professora emérita, mas também “nossa amiga Marilena, que nos cativa por sua inteligência e, mais ainda, por suas qualidades morais, por suas virtudes”, enfatizou.


Docência


Depois da saudação, a diretora Maria Arminda entregou o diploma com o título de professora emérita da FFLCH. Emocionada, Marilena disse que gostaria que seus pais estivessem vivos neste momento para ela lhes dizer: “missão cumprida!”.

Em seguida, a docente contou um pouco de sua trajetória, desde a época do ginásio, atual ensino fundamental, passando pelo colegial, atual ensino médio. E acabou proferindo uma aula sobre autoritarismo, defesa da universidade pública e a concepção da docência.

“Nos dias que correm, a Filosofia é considerada como uma profissão entre outras. Não é assim que a considero, mas um modo de vida (...) Penso que, quem busca a Filosofia, como forma de expressão, decidiu-se por um certo modo de vida. (...) É uma decisão existencial, como parece com tanta clareza nas primeiras linhas do Tratado da Emenda do Intelecto, de Espinosa”, frisou Marilena.


A nova emérita da FFLCH também falou de sua vocação para a docência. “Penso que nasci para ser professora, seguindo os passos de minha mãe. Na verdade, pela experiência formadora que tivera com as aulas de Filosofia no curso secundário [atual ensino médio], preparei-me para ser professora no secundário e lecionei no Colégio Estadual Alberto Levy nos anos de 1965 e 1966. Por isso, nunca me passou pela cabeça que poderia tornar-me professora no Departamento de Filosofia de nossa Faculdade”.

Ela contou que em alguns momentos, por ser mulher e mãe, teve sua capacidade questionada em um mundo acadêmico majoritariamente masculino. Além disso, relatou outros em que os docentes eram vigiados em sala de aula durante a ditadura militar.

“Sob o signo da história, pude compreender que o autoritarismo estrutura a sociedade brasileira na qual vigora a violência sob formas invisíveis e impalpáveis, indo do machismo ao racismo, do preconceito de classe aos preconceitos sexuais, naturalizando exclusões e desigualdades e escondendo sob a indivisão imaginária do verdeamarelismo as divisões sociais e as injustiças”, explicou.  


Defesa da universidade pública

Segundo Marilena, a decisão filosófica e política a guiou na luta contra a destruição da universidade pública e laica. O primeiro momento deu-se com a imposição da “universidade funcional” dos anos 70, o segundo foi o da “universidade de resultados”, dos anos 80, e, a partir dos anos 90, sob os efeitos do neoliberalismo, deu-se a nova fase destrutiva com a implantação da “universidade operacional”.

“Vivemos hoje um momento desinstitucionalização da República e de destruição de conquistas democráticas”, lamentou.

E aproveitou a ocasião para citar os casos ocorridos com membros das Universidades Federais de Santa Catarina e de Minas Gerais (UFSC) e (UFMG) – alvos de operações da Polícia Federal que levaram coercitivamente para depor reitores, dirigentes e funcionários destas instituições – dedicando as palavras a Heloisa Gurgel Starling “que nos honra com sua presença e nos ensina com sua pertinência e coragem”.

Heloisa é ex-vice-reitora da UFMG e também foi alvo da operação “Esperança Equilibrista” da Polícia Federal. No anúncio das autoridades, ela foi
ovacionada de pé pelos presentes em desagravo à ação realizada anteriormente.

“Quero agradecer aos amigos que hoje me concederam tão grande honraria, dizendo-lhes, com Espinosa, que somente os que são livres possuem fortaleza de ânimo e generosidade e por isso são gratos uns aos outros, ligando-se pelos laços da amizade”, encerrou.

Presenças


Muitos alunos também estiveram presentes e, além das autoridades citadas acima, pode-se destacar a presença dos professores eméritos da FFLCH: Francis Henrik Aubert, diretor da Unidade de 1998-2002; Sedi Hirano – que também foi diretor de 2002-05 e pró-reitor de Cultura e Extensão Universitária da USP de 2005-07; José Pereira de Queiroz Neto.

Marcou presença a atual diretora do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB), Sandra Margarida Nitrini, e ex-diretora da Faculdade de 2008-2012; o relator especial para Direitos Humanos para Síria-Genebra, Paulo Sérgio Pinheiro, também docente do Departamento de Ciência Política da Unidade.

De outras Unidades da USP: o diretor da Escola de Educação Física e Esporte de Ribeirão Preto (EEFERP), Cristiano Roque Antunes Barreira; e o vice-direto do Instituto de Psicologia (IP), Andrés Eduardo Aguirre Antúnez.

Representando instituições externas: a reitora da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), Maria Amalia Pie Abib Andery; o reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), João Carlos Salles Pires da Silva, e representante da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior no Brasil (Andifes).