Novo dossiê (V. 1, nº 41/2022) da Revista Via Atlântica está disponível
Título do dossiê: Margens do Atlântico em português: persistências coloniais e insurgências na literatura e a na arte. O editorial convida à leitura do dossiê. Seguem dois trechos escritos pelos editores Luca Fazzini, Emerson da Cruz Inácio, Roberto Francavilla:
A especificidade da formação política e cultural moderna a que pretendo chamar de Atlântico negro pode ser definida, em um nível, por este desejo de transcender tanto as estruturas do estado-nação como os limites da etnia e da particularidade nacional. Estes desejos são pertinentes ao entendimento da organização política e da crítica cultural. Eles sempre se sentiram pouco à vontade com as escolhas estratégicas impostas aos movimentos negros e com indivíduos imbricados em culturas políticas nacionais e estados-nações na América, no Caribe e na Europa. (O Atlântico negro: modernidade e dupla consciência – Paul Gilroy).
Quem me pariu foi o ventre de um navio
Quem me ouviu foi o vento no vazio
Do ventre escuro de um porão
Vou baixar no seu terreiro
Êpa raio, machado e trovão
Êpa justiça de guerreiro (Yáyá Massemba – Roberto Mendes e José Carlos Capinan)
[...]
Qual o Atlântico que então se delineia por trás dessas numerosas contribuições teóricas, literárias, cinematográficas e musicais? Nas entrelinhas desses dezanoves textos (ou vinte?) que compõem o dossiê, o Atlântico que emerge pelas suas margens é, de fato, um “entre-lugar”, um espaço poroso que absorve de várias fontes culturais, que subverte as normas impondo o desvio, que corrói limites e fronteiras. Nesse cenário, o que Silvano Santiago escreveu sobre o “entre-lugar” do discurso latino-americano, vale também pelas escritas do Atlântico reunidas nessas páginas: “entre o sacrifício e o jogo, entre a prisão e a transgressão, entre a submissão ao código e a agressão, entre a obediência e a rebelião, entre a assimilação e a expressão ─ ali, nesse lugar aparentemente vazio, seu templo e seu lugar de clandestinidade, ali, se realiza o ritual antropófago da literatura latino-americana” (SANTIAGO, 2000, p. 26). Igualmente, na absorção de modelos dissonantes, no carnaval das alteridades e no ímpeto subversivo das multidões que desenham as culturas do Atlântico, convidamos os leitores a ler estratégias de insurgência e formas alternativas de pertencimento: a política na arte e arte como dispositivo da política. (Editorial completo: páginas 4-13).