Escritor e pintor alemão, escreveu livros como Sidarta e O Lobo da Estepe, que geram reflexões sobre a vida e seu sentido aos seus leitores
Vencedor do Prêmio Nobel de Literatura de 1946, Hermann Hesse é um dos autores de língua alemã mais lidos mundialmente. O escritor, que inicialmente deveria se formar como teólogo, experimentou cedo na casa dos pais o protestantismo pietista da Suábia, região localizada no sudoeste da Alemanha, que se revelou desde muito cedo um caminho inviável a ele.
Na sua infância, Hesse obteve contato com várias culturas: seu pai vivia muito tempo na Estônia, sua mãe na Índia, país em que seu avô materno também fora missionário e sua família havia residido tanto na Alemanha quanto na Suíça. Além disso, foi um dos maiores estudiosos das línguas e religiões indianas da sua época, dessa forma, Hesse se manteve em contato com estudiosos da Índia, levando-o a uma viagem para Ceylon (atual Siri Lanka).
Com elementos do Budismo, Taoísmo e Gnosticismo, os livros de Hesse são referências para uma grande vertente de leitores que buscam uma orientação espiritual em seus livros. Entretanto, isso não significa que a sua literatura pode ser reduzida apenas a essa temática. O escritor nunca aderiu ao Budismo ou outra religião oriental, sua obra Sidarta, por exemplo, não segue a famosa lenda indiana sobre o futuro Buda.
Segundo o professor associado da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, Helmut Galle, “O que qualifica o Sidarta, desde sua publicação em 1922, como fonte de inspiração para leitores modernos refletirem sobre sua vida e o sentido do mundo não é uma oferta pronta, uma religiosidade a ser aderida, mas uma ficção que mostra como essa busca pode dar certo para um ser humano. As experiências que Hesse fez, também em contato com a psicanálise da vertente de C. G. Jung, entram nos seus livros, mas nenhum deles apresenta uma solução definitiva: a busca sempre continua”.
Na sua obra, Demian, publicada em 1919, o escritor se utilizou da figura do Abraxas, para simbolizar a superação do dualismo cristão e a busca por um caminho individual. Outra forma de evolução espiritual também é apresentada no livro Lobo da Estepe, de 1927, em que a aprendizagem espiritual do protagonista ocorre mediante figuras dedicadas à vida moderna dos dancing halls e do consumo de drogas.
O escritor sempre foi um caso controverso para os estudiosos de Letras. “O problema da Teoria literária com Hesse é que ele, no contexto do grande laboratório de experimentações que era a primeira metade do século 20, parece um romântico retrógrado que se utiliza de técnicas anacrônicas.” afirma o professor.
Sua obra, principalmente nas duas primeiras décadas, está inserida no contexto do romantismo, entretanto, essa fase não se limita apenas a isso. Assim como nas obras de Kafka, Döblin e Thomas Mann, os protagonistas de Hesse apresentam as mesmas adversidades típicas do início do século 20, ainda que suas reações sejam outras.
Apesar de sua poesia lírica ser considerada inferior em relação a outros poetas alemães da mesma época, como por exemplo: George, Hofmannsthal, Rilke, Trakl, Benn e Brecht, muitos dos poemas de Hesse ganharam notoriedade por meio de grandes compositores, como em Quatro últimas canções, de Richard Strauss. Além disso, Hesse pintava aquarelas, que geralmente retratavam paisagens, era um grande consumidor de literatura e escreveu centenas de resenhas sobre livros de escritores novos.
Em relação à vida pessoal de Hesse, Galle acrescenta que o autor reagiu à Primeira Guerra Mundial de forma entusiasta, saudando o que ele considerava uma virada da então vida burguesa convencional e calcificada que odiava. Posteriormente, Hesse corrigiu sua atitude e tornou-se uma importante voz pacifista europeia durante o resto da vida, sendo hostilizado pelo mundo público na Alemanha da época.
Helmut Galle é professor associado em Literatura Alemã pela USP. Tem experiência na área de Letras, com ênfase em Literaturas Estrangeiras Modernas, atuando principalmente na área de literatura alemã.