Criação da Funai

Órgão indigenista é responsável por garantir o reconhecimento social, crenças, tradições e costumes dos povos indígenas

Por
Isadora Batista
Data de Publicação

Criação da Funai
(Arte: Isadora Batista/ Serviço de Comunicação Social FFLCH USP)

A Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) foi criada no dia 5 de dezembro de 1967, substituindo o antigo Serviço de Proteção aos Índios (SPI), com o objetivo de preservar e promover os direitos dos povos indígenas do Brasil. 

O órgão indigenista oficial do Estado brasileiro é responsável por garantir o reconhecimento social, crenças, tradições e costumes dos povos indígenas, além de garantir o desenvolvimento sustentável dessas populações e a fiscalização de políticas voltadas para os direitos indígenas. 

Segundo Guilherme Bianchi Moreira, professor do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, invasões territoriais de madeireiros e garimpeiros, expansão do agronegócio em terras indígenas e questões advindas do aquecimento global são os principais desafios da Funai atualmente.

Confira a entrevista completa com Guilherme Bianchi Moreira:

Serviço de Comunicação Social: O que é a Funai?

Guilherme Bianchi Moreira: A Funai é, desde 1967, o órgão indigenista oficial do Estado brasileiro. A criação da Funai, em plena ditadura militar, teve a ver com a extinção do antigo Serviço de Proteção ao Índio (SPI) pelos militares, como resultado de uma Comissão Parlamentar de Inquérito que investigou diversos crimes cometidos no interior do SPI. Por muitas décadas, acreditou-se que o relatório final dessa CPI tivesse sido perdido em um incêndio no Museu do Índio. No entanto, o documento (que hoje conhecemos como "Relatório Figueiredo") foi encontrado pelo pesquisador Marcelo Zelic em meio aos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade, e serve hoje como referência importante para entender o funcionamento do SPI na prática, e também das continuidades a partir da criação da Funai.

Serviço de Comunicação Social: Qual o papel da Funai em relação aos direitos dos povos indígenas?

Guilherme Bianchi Moreira: Segundo o estatuto da fundação, sua finalidade é promover os direitos dos povos indígenas, através da coordenação de uma política indigenista baseada no reconhecimento da organização social e dos costumes dos povos indígenas, e por garantias relacionadas a seus direitos sociais, econômicos e culturais. No entanto, é preciso observar que, enquanto órgão do governo federal, as ações da Funai estiveram sempre conectadas às prerrogativas políticas e econômicas dos governos nacional, de modo que, para entender sua história, é preciso também entender a relação que, em cada contexto específico, a Funai manteve com as agendas político-econômicas governamentais. Em todo caso, a existência de um órgão oficial dedicado à política indigenista, também significou (sobretudo após o final da ditadura) a possibilidade de negociação e ativação das estruturas administrativas do órgão para a defesa efetiva dos modos de vida indígenas, ainda que, em vários governos pós-redemocratização, por vezes o órgão tenha sido aparelhado para a defesa de interesses governamentais desenvolvimentistas ou em conluio com a agenda política do agronegócio.

Serviço de Comunicação Social: Quais são as principais políticas públicas implementadas pela Funai nos últimos anos? E quais são os principais desafios enfrentados por ela atualmente?

Guilherme Bianchi Moreira: Quanto às principais políticas públicas implementadas pela Funai, é preciso citar a centralidade dos processos de reconhecimento e de demarcação territorial. O processo de demarcação é o meio administrativo para identificar os limites do território tradicionalmente ocupado pelos povos indígenas e garantir a ocupação efetiva do território em questão. Cabe à Funai identificar e delimitar os territórios, junto de estudos antropológicos e dos próprios grupos indígenas envolvidos, antes da efetiva demarcação. Os processos são, na maioria das vezes, demorados e implicam um amplo esforço coletivo e vontade política. É importante destacar que, durante o governo de Jair Bolsonaro, nenhum centímetro de terras indígenas foi demarcado, o que só voltou acontecer de fato nos últimos anos, com a reestruturação da Funai (pela primeira vez na história com uma presidente indígena, Joenia Wapichana) e com a criação do Ministério dos Povos Indígenas. Para além dos processos de demarcação, os desafios enfrentados hoje referem-se sobretudo às invasões territoriais de madeireiros e garimpeiros, à expansão do agronegócio em terras indígenas, sem falar da ameaça crescente das questões advindas do aquecimento global, como a falta de chuvas e a seca dos rios.

Guilherme Bianchi Moreira é professor do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. É graduado em História pela Universidade Federal de Ouro Preto, mestre em História pela Universidade Federal do Paraná e doutor em História pela Universidade Federal de Ouro Preto. Desenvolve estudos na área de história indígena, teoria da história e história intelectual.