Nota de Falecimento: Sergio Miceli

Por
Redação
Data de Publicação
Editoria
O professor Sergio Miceli em frente a uma estante de livros. Foto de Cecília Bastos para o Jornal da USP
Professor Sergio Miceli – Foto: Cecília Bastos / USP Imagens

Informamos com pesar o falecimento de Sergio Miceli Pessoa de Barros, Professor Emérito da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, docente aposentado do Departamento de Sociologia da FFLCH e diretor da Edusp, nesta sexta-feira, 12 de dezembro. O velório foi realizado no sábado, 13 de dezembro, das 13h30 às 16h30, no Cemitério Parque Morumby, Rua Deputado Laércio Corte, 468.

A professora Maria Arminda do Nascimento Arruda, socióloga e docente do Departamento de Sociologia da FFLCH e vice-reitoria da USP, escreveu homenagem ao professor:

Nesta triste data em que as ciências sociais brasileiras perdem o sociólogo Sergio Miceli Pessoa de Barros, eu perco um amigo de toda vida e parceiro de jornada. Como primeiro gesto, ofereço minhas condolências à antropóloga e professora Heloísa Pontes, com quem Sergio foi casado por décadas, aos seus filhos e demais familiares, aos amigos e interlocutores no Brasil e no exterior, assim como aos professores, pesquisadores, orientandos, alunos e funcionários da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH/USP) que privaram da sua convivência ao longo dos anos.

Realizar um necrológio a seu respeito seria, além de exercício pessoalmente impossível neste momento crucial, um recurso que certamente levaria Sergio a inquirir os sentidos de tal gesto. Por essas razões, opto por recuperar um excerto do texto que preparei em sua homenagem, quando o mesmo foi agraciado com o Título de Professor Emérito da USP, em 2022, o qual me parece oferecer uma síntese momentânea a seu respeito, e que reproduzo a seguir:

Entre os cientistas sociais brasileiros, é consenso atribuir à obra de Sérgio Miceli Pessoa de Barros a qualidade de periodizar o campo da sociologia da cultura no Brasil. A sua vasta produção sociológica combina apuro analítico, domínio da teoria social, construção de problemas de pesquisa incomuns ao cânone assentado, visadas interpretativas inusitadas. O caráter vivaz da sua reflexão revela-se na abertura de novos temas, distingue-se por inspirar as gerações de cientistas sociais, por exercer o papel de formador, por ser liderança acadêmica e institucional, por assinalar o rumo dos debates.

Sérgio Miceli se consagrou como um escolástico que nos legou um método original para o estudo das condições sociais de emergência do trabalho artístico e intelectual entre nós; como introdutor e, possivelmente, principal veiculador do pensamento de Pierre Bourdieu na nossa sociologia, e, por fim, como um organizador de grupos de pesquisa e um orientador de teses prolífico, cujos trabalhos supervisionados formaram, no decorrer dos anos, um amplo panorama sobre a constituição do campo intelectual no Brasil. Ao mesmo tempo, tudo isso se expressa sob a forma de um pesquisador ostensivamente crítico e em permanente tensão com os traços sociais do seu próprio meio.

Entre 2022 e 2025, Sergio Miceli também presidiu, pela segunda vez, a Editora da Universidade de São Paulo. Sua atuação neste período tornou a Edusp uma das maiores editoras universitárias da América Latina, com recordes de lançamentos, expansão de lojas e acúmulo de premiações. Realizou este trabalho sem descurar-se do compromisso com a liderança do seu campo intelectual. Entre outros seminários, simpósios e debates dos quais participamos juntos nos últimos quatro anos – no Brasil e na Argentina – tive a oportunidade de com ele organizar o 6º Congresso de História Intelectual da América Latina (CHIAL, 2023), quando reunimos pesquisadores de todo o continente, e estudiosos deste objeto nas instituições do hemisfério norte, para realizar um amplo balanço sobre este campo de estudos.

Reitero meus sentimentos a todas as pessoas que, de alguma maneira, foram tocadas pela pessoa e pela obra de Sergio Miceli. Estou certa que o seu legado servirá de guia à trajetória intelectual das próximas gerações de intelectuais e cientistas sociais.

São Paulo, 12 de dezembro de 2025.

Maria Arminda do Nascimento Arruda
Socióloga e professora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH/ USP)
Vice-reitora da Universidade de São Paulo

---

O Departamento de Sociologia e o Programa de Pós-Graduação em Sociologia da FFLCH divulgaram a nota de pesar no site de departamento e reproduzida abaixo:

"O Departamento e o Programa de Pós-Graduação em Sociologia da USP comunicam, com pesar, o falecimento de Sergio Miceli, ocorrido em 12 de dezembro de 2025.

Sergio Miceli Pessoa de Barros (1945-2025) reforçava sua ascendência calabresa assinando com o sobrenome italiano. Nascido e criado no Rio de Janeiro, veio para São Paulo querendo se pós-graduar na linha de Florestan Fernandes, mas logo imprimiu sua marca muito própria e única, mestrando-se com o trabalho inaugural acerca da “Noite da madrinha”, que desde então alimenta gerações de sociólogas e sociólogos interessados nos fenômenos e nas dinâmicas culturais.
Sociólogo inquieto e incansável, apaixonado e brilhante, publicou muitos livros, ensinou e orientou por muitos anos, de sorte que sua presença fica viva em todos os que o leram e ouviram, e continuarão lendo e vendo e ouvindo (há vários vídeos no Youtube, assim como vários livros nas prateleiras). 

Sua inquietude o levou a procurar Pierre Bourdieu quando este ainda era bem desconhecido por aqui, e logo o traduziu e editou. Embora seja o seu mestre, Sergio pensava por si mesmo, não por impertinência ou arrogância, mas em virtude de uma visceral inquietude intelectual. 

Resultado de sua estadia com Bourdieu foi seu doutoramento sobre a elite intelectual, decerto o seu livro mais lido e referido. Entretanto, Sergio escreveu sobre muitos temas, coordenou muitos projetos de pesquisa, muitos grupos de pesquisadoras/es, e sua vivacidade contaminou — e, creio, continuará contaminando — muitas pessoas. 

Sua liderança institucional fez-se sentir na FGV, no Idesp, na Unicamp, na USP, na Anpocs, na EDUSP, na editora Perspectiva, na revista Tempo Social, e em várias outras instituições. Seu impacto se fez sentir também fora do Brasil, em suas temporadas na Argentina, na França e nos EUA. 

Mas, se exerceu cargos, não foi jamais como um burocrata ou mero organizador e gestor, mas como atiçador, verdadeiro agente provocador. 

Fã de ópera, leitor voraz, gostava de uma série televisiva e de um bom filme, e não deixava de lado o teatro. O que via e ouvia era assunto para conversa e matéria para reflexão. 

Em qualquer situação, quem estava ao seu lado saía mais inteligente do que quando chegou. Assim foi e assim continuará sendo."

Texto por Leopoldo Waizbort

---

A Reitoria da USP também manifestou pesar pelo falecimento do professor em nota publicada no Jornal da USP, e decretou luto oficial de três dias na Universidade:

Reitoria lamenta falecimento de Sergio Miceli, diretor da Edusp e referência da sociologia brasileira

Sergio Miceli Pessôa de Barros era professor titular do Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH); a Reitoria decretou luto oficial de três dias

A Reitoria lamenta profundamente o falecimento do diretor-presidente da Editora da USP (Edusp), sociólogo e professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), Sergio Miceli Pessôa de Barros, ocorrido hoje, dia 12 de dezembro, em São Paulo.

Graduado pela Pontíficia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC Rio) e mestre pela USP, Miceli construiu uma trajetória acadêmica brilhante, marcada pela dupla titulação de doutorado em 1978, pela USP e pela École des Hautes Études en Sciences Sociales, na França, sob a orientação do renomado sociólogo Pierre Bourdieu. Sua tese Intelectuais e Classe Dirigente no Brasil, 1920-1945 pode ser considerada como obra de referência fundamental na área da sociologia.

Tornou-se professor da USP em 1989, mesmo ano em que se deu a publicação da História das Ciências Sociais no Brasil, obra coletiva que coordenou no Instituto de Estudos Econômicos, Sociais e Políticos de São Paulo (Idesp) e que reuniu pesquisadoras e pesquisadores como a vice-reitora da Universidade, Maria Arminda do Nascimento Arruda. Miceli foi um prolífico autor e organizador, com mais de 40 livros publicados, e foi responsável por introduzir e organizar obras essenciais de Bourdieu no Brasil, como A Economia das Trocas Simbólicas.

À frente da Edusp desde março de 2022, cargo que já havia ocupado na década de 1990, Miceli se dedicou a fortalecer o papel das editoras universitárias. Defendia com vigor a publicação de obras de alto valor cultural e científico que, em suas palavras, “as editoras comerciais jamais fariam”.

Miceli deixa um legado inestimável para o pensamento social e para a publicação acadêmica no País. A Reitoria da USP se solidariza com sua esposa Heloísa Pontes, seus três filhos, amigos, alunos e colegas da FFLCH e da Edusp neste momento de perda irreparável para a cultura e a ciência brasileira.

O velório será realizado no dia 13 de dezembro, no Cemitério Parque Morumby (Rua Dep. Laércio Corte, 468, Paraíso do Morumbi, em São Paulo), das 13h30 às 16h30. Não haverá sepultamento. A Reitoria decretou luto oficial de três dias.

Texto original do Jornal da USP:
https://jornal.usp.br/noticias/reitoria-lamenta-falecimento-de-sergio-miceli-diretor-da-edusp-e-referencia-da-sociologia-brasileira/

---

A Diretoria do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP também homenageou o professor:

Com muita tristeza, comunicamos o falecimento do Professor e amigo Sérgio Miceli Pessoa de Barros. Atualmente, o professor Sérgio atuava como Diretor da EDUSP, tendo trabalhado de forma decisiva na recuperação da Editora, elevando-a a patamares de destaque que culminaram em seu reconhecimento como uma das principais editoras universitárias do Brasil.

A Diretoria do IAG expressa seus sentimentos à família, à EDUSP e à FFLCH, unidade na qual o professor Sérgio atuou junto ao departamento de Sociologia, durante toda a sua vida acadêmica.