A vice‑reitora da USP, Maria Arminda do Nascimento Arruda, foi agraciada no último dia 15 de julho com a Medalha Florestan Fernandes, em cerimônia realizada no Centro de Difusão Internacional (CDI) da Universidade durante a abertura do 22º Congresso Brasileiro de Sociologia. O evento, promovido pela Sociedade Brasileira de Sociologia (SBS), acontece até esta sexta, 18 de julho, no Campus Capital-Butantã.
A Medalha Florestan Fernandes, concedida pela SBS em homenagem ao legado do sociólogo patrono da Sociologia Crítica no Brasil, é destinada a pesquisadores cuja história acadêmica reflete um impacto significativo na produção sociológica nacional, em publicações acadêmicas, na formação de novos pesquisadores ou atuação institucional. A seleção é realizada pela instituição em consulta aos membros de seu comitê científico e à comunidade sociológica, buscando um consenso em torno das personalidades que serão reconhecidas na abertura de cada Congresso Brasileiro de Sociologia. Entre os laureados anteriores estão nomes como Fernando Henrique Cardoso, Luiz Werneck Vianna, Octavio Ianni, Antonio Candido, Leôncio Martins Rodrigues e Eva Blay.
A entrega da distinção foi feita pelo sociólogo Sergio Adorno, que destacou a relevância acadêmica, intelectual e institucional da homenageada e lembrou que compartilha com ela uma trajetória entrelaçada na Universidade de São Paulo. “Nós somos da mesma geração, do mesmo departamento”, lembrou, emocionado, citando episódios marcantes dessa convivência, como a banca de ingresso de Maria Arminda na USP, que ele integrou: “Jamais vou esquecer a memorável aula que ela proferiu”.
Adorno ressaltou as contribuições teóricas e de gestão da professora: “Ela é uma das poucas intelectuais que conseguem aliar o papel de produtora de conhecimento e instigadora de ideias com o de gestora acadêmica e política, sempre prezando pela transparência, democracia e interesse público e visando ao bem comum”, afirmou. Entre as obras de destaque de Maria Arminda, citou A Embalagem do Sistema – A Publicidade no Capitalismo Brasileiro; Mitologia da Mineiridade; História e Sociologia: O Brasil entre Dois Séculos e Metrópole e Cultura – São Paulo no Meio Século XX, vencedor de menção honrosa no Prêmio Jabuti, ressaltando a combinação de “rigor metodológico com uma refinada imaginação sociológica”.
Ao final, exaltou a atuação pública da professora e sua capacidade de transitar com competência entre cultura e poder. “Maria Arminda, você nos ensina muito”, concluiu, afirmando que Florestan Fernandes estaria orgulhoso de vê-la entre as homenageadas do congresso.
Ao longo do discurso de agradecimento, a vice-reitora fez um resgate de sua trajetória e apontou desafios da sociologia contemporânea. Ela dedicou a honraria “a todos os que vieram e a todas que vieram antes de mim”, destacando que sua formação na USP, mesmo em tempos difíceis, moldou profundamente sua identidade. “Eu fui me tornando uma socióloga do ponto de vista da minha identidade. E essa roupa que cobre a minha personalidade, que é ser socióloga — ser mulher e socióloga —, é para mim motivo de grande orgulho”, declarou, rememorando o início de sua formação, contando que, embora pretendesse cursar Direito, foi politizada por um grupo de jovens durante o período da ditadura e acabou optando pelas Ciências Sociais. “Confundi, como muitas gerações, sociologia com socialismo”, disse, em tom descontraído, para em seguida defender o papel crítico da disciplina: “A sociologia é, de fato, uma disciplina profundamente crítica, porque é nossa condição, do exercício da reflexão”.
No pronunciamento, também expressou sua visão sobre a importância do pensamento coletivo na construção do conhecimento. “Nós não existimos como nós mesmos, a não ser imersos nesse coletivo. Isso dá uma certa humildade”, disse. E acrescentou: “Ninguém pensa por si mesmo. O nosso pensamento é coletivo”.
Encerrando sua análise, retomou conceitos centrais da tradição sociológica brasileira para apontar os caminhos da disciplina hoje. Relembrando textos de Florestan Fernandes, citou a evolução do pensamento sociológico como afirmação, interrogação e interlocução, propondo uma nova etapa: “Eu ousei dizer que eu penso que a sociologia hoje é a sociologia como autorreflexão. Nós temos que rever nossos métodos, nossos objetos e os nossos recortes disciplinares, porque o mundo é desafiador demais”.
Compartilhando a homenagem com outras duas premiadas — Élide Rugai Bastos, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e Fernanda Sobral, da Universidade de Brasília (UnB) – , concluiu: “Este prêmio que eu recebo humilde e honrada não é meu, ele é de todos nós. É da comunidade das sociólogas, em primeiro lugar, e dos sociólogos brasileiros”.
Produção acadêmica em exposição
Outra homenagem recebida pela vice-reitora é a exposição Sociologia, Cultura e Universidade: A trajetória de Maria Arminda do Nascimento Arruda, que foi inaugurada no dia 15 e segue em cartaz até o dia 30 de julho, na Biblioteca Florestan Fernandes, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH). A mostra apresenta a trajetória acadêmica da professora e leva ao público uma seleção de livros de autoria e organização da docente, além de páginas de rosto de dissertações e teses orientadas por ela, entrevistas e vídeos com depoimentos ao longo de sua carreira. Parte do conteúdo está disponível em formato digital, acessível por QR Codes distribuídos ao longo da exposição e também na página https://biblioteca.fflch.usp.br/ExpMariaArminda. Os livros ficam disponíveis no expositor de Produção Intelectual dos Docentes da FFLCH e podem ser manuseados livremente. A entrada é gratuita. A Biblioteca Florestan Fernandes está localizada na Avenida Prof. Luciano Gualberto, 315, Cidade Universitária, São Paulo (prédio da Biblioteca da FFLCH).

Trajetória e legado intelectual
Com vasta produção que abrange a sociologia da cultura, a história dos intelectuais, comunicação de massas e a teoria sociológica, Maria Arminda é socióloga com graduação, mestrado, doutorado e livre‑docência pela USP e, antes de ocupar o cargo de vice-reitora da Universidade, já foi pró‑reitora de Cultura e Extensão Universitária e diretora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), onde também coordenou o Programa de Pós‑Graduação em Sociologia e foi chefe do Departamento de Sociologia.
Além dos livros citados durante a cerimônia de homenagem, é também autora e organizadora de publicações como Florestan Fernandes, Mestre da Sociologia Moderna; Pensamento Social no Brasil; A Revolução Burguesa no Brasil; e Que Tipo de República?, entre outros.
A professora também já exerceu os cargos de secretária-executiva da Associação Nacional de Pós-Graduação em Ciências Sociais (Anpocs) e representante da área de Sociologia na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Atualmente é vice‑presidente do Observatório das Instituições Brasileiras, integrante do Conselho Superior da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e membro da Academia de Ciências do Estado de São Paulo.
Assista, a seguir, ao vídeo da cerimônia de entrega do prêmio a Maria Arminda do Nascimento Arruda:
Texto por Michel Sitnik/ Jornal da USP
Publicação original: https://jornal.usp.br/institucional/vice-reitora-da-usp-e-homenageada-por-trajetoria-de-destaque-na-sociologia-brasileira/