Segundo pesquisa Datafolha, de 2016, 70% dos paulistanos acreditam que as periferias deveriam receber mais investimentos públicos, indicando possível omissão governamental nessas áreas. Um mestrado da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP demonstrou um resultado diferente: a consolidação das periferias - especificamente da Zona Leste de São Paulo - é resultado de uma "ausência pensada" do Estado, que fez disso uma escolha de planejamento urbano para a região.
Segundo Jhonny Torres, autor da dissertação, essa exclusão socioespacial de bairros na Zona Leste se deu principalmente por meio da articulação entre transporte de massa e habitações populacionais. Um exemplo disso foi a criação do Expresso Leste, conhecido como Linha 11–Coral da CPTM, e a construção de moradias sociais na região pela Companhia de Habitação Popular (COHAB).
Jhonny afirma que os conjuntos habitacionais criados em Itaquera tinham o objetivo de transferir a periferia do centro para locais mais distantes. “A integração entre moradia e transporte distante do centro, longe de solucionar a questão habitacional na cidade, aprofundou a segregação socioespacial ao reforçar a lógica de marginalização da população mais pobre em áreas distantes do centro da cidade e, assim, de equipamentos urbanos”, ressalta.
No que diz respeito ao transporte de massa, com a criação do Expresso Leste, a estação Parada XV de Novembro foi desativada e em seu lugar foi construído um trecho da Radial Leste. Jhonny explica que a população residente nas proximidades da antiga estação deixou de contar com uma parada próxima do metrô, sendo obrigada a se deslocar de ônibus até as estações José Bonifácio ou Itaquera. Assim, segundo o pesquisador, houve aumento tanto no tempo quanto no custo do trajeto.
“O metrô e o trem demonstram, a partir da mobilidade, para quem e para o que é produzido o espaço urbano na cidade. A ideia é de uma cidade funcional, no sentido de levar a população pobre da periferia para o centro com o intuito de trabalhar. O metrô é feito nos lugares onde as pessoas só chegam para trabalhar e não para viver culturalmente”, destaca.
Dessa forma, Jhonny argumenta que o Estado e seu aparato de planejamento operam na segregação socioespacial e na precarização da vida urbana dessas localidades. Esse mecanismo, conforme afirma o pesquisador, é realizado de maneira deliberada pelo governo, que “é percebido não como mediador, mas como aquele que, ao invés de garantir direitos, se apresenta como um usurpador”.
Ainda que ocorra essa “ausência planejada”, a dissertação esclarece que os moradores do bairro da Parada XV de Novembro se organizaram para lutar pela reativação da estação e contra a precarização que a desativação causou em suas vidas. “Mais do que uma reivindicação por infraestrutura, trata-se da afirmação de que a cidade não pode ser reduzida a um conjunto de variáveis demográficas ou tabelas estatísticas”, conclui.