Professor da USP recebe prêmio por trajetória de excelência na sociologia

Mais conhecido pelo estudo das religiões de matriz africana, Reginaldo Prandi foi homenageado no 49º Encontro Anual da Anpocs
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Redação
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Da esquerda para a direita: Mário Augusto Medeiros da Silva, professor da Unicamp e diretor de Publicação da Anpocs; Nadya Guimarães, professora do Departamento de Sociologia da FFLCH; Reginaldo Prandi, professor da FFLCH premiado no evento; Maria Filomena Gregori, professora da Unicamp e presidente da Anpocs; Rozeli Maria Porto, professora da UFRN e secretária-adjunta da entidade; e Renata Mirandola Bichir, professora da EACH e secretária-executiva da associação – Foto: Divulgação/Anpocs
 

Sociólogo renomado e professor emérito da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, Reginaldo Prandi recebeu nessa quarta-feira (24) o Prêmio Anpocs de Excelência Acadêmica Antônio Flavio Pierucci em Sociologia. A cerimônia de premiação foi realizada durante o 49º Encontro Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), sediado no campus da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), no interior de São Paulo.

Professor aposentado do Departamento de Sociologia da FFLCH, Reginaldo Prandi é muito conhecido pelos seus estudos no campo da sociologia das religiões. Ele é autor do livro Mitologia dos Orixás, editado pela Companhia das Letras em 2001 e indicado ao Prêmio Jabuti em 2002. Segundo a professora Nadya Araújo Guimarães, colega de departamento que foi responsável por apresentar a trajetória acadêmica de Reginaldo durante a cerimônia, o livro de 2001 é a mais completa coleção de mitos da religião dos orixás já reunida no Brasil, escrita com base em mais de 300 relatos mitológicos. Com grande acolhida do público, o livro teve 41 reimpressões.

Outro livro importante de sua autoria é Os candomblés de São Paulo: a velha magia na metrópole nova, editado em 1991. Baseado em sua tese de livre docência, o livro marcou uma trajetória de pesquisa sobre os caminhos e sentidos da difusão do candomblé em São Paulo. Ainda no tema das religiões, além do candomblé e da umbanda, o docente pesquisou também o catolicismo, o espiritismo kardecista e o pentecostalismo.

Não escapou a Reginaldo a ironia de receber um prêmio que tem como patrono o falecido professor da USP Antônio Flavio Pierucci, que foi seu orientando no doutorado, colega de trabalho e amigo pessoal. Ele presenteou ao público que acompanhava o evento algumas interessantes anedotas sobre o companheiro, incluindo uma sobre a maneira como Flávio foi expulso do sacerdócio católico após pichar os muros do Pontifício Colégio Pio Brasileiro, em Roma, para denunciar a complacência do arcebispo de São Paulo com a tortura perpetrada pela ditadura militar.

Reginaldo lembrou também de sua participação na “reunião zero” da Anpocs, em Belo Horizonte de meados anos 1970. O professor viajou acompanhando Fernando Henrique Cardoso e Maria Isaura Pereira de Queiroz para essa reunião, que marcou a fundação da associação.

A ditadura fez uma reforma universitária que começou a funcionar em 1971. E a ideia da ditadura era pulverizar a universidade, era transformar a universidade numa coisa desconectada do resto do País e desconectada entre si nas suas unidades, de forma que ela fosse tão autônoma que nem ia dar bola para a universidade vizinha. As universidades tinham que se juntar pra poder se defender. E vai juntar de que jeito? Junta naquilo que ela faz, que é a pesquisa, que é a produção do conhecimento”, disse o professor Reginaldo.

Para além da sociologia das religiões, o professor também tem contribuições importantes em outros domínios da sociologia. Antes de mergulhar o tema das religiões, Reginaldo se dedicou a uma agenda de pesquisa típica da sociologia latino-americana dos anos 1960, que procurava explicar a mudança social pelo prisma das relações entre o trabalhador precário e as transformações da estrutura de classes impulsionadas pela urbanização na periferia do capitalismo. Ele fez também importantes contribuições metodológicas às ciências sociais brasileiras. Especialista em amostragem e métodos quantitativos, o professor foi responsável pelo desenvolvimento da metodologia das pesquisas de opinião no País, tendo sido um dos fundadores do Instituto Datafolha.

“Ele foi um dos primeiros pesquisadores brasileiros a lidar com a informática e acumular um repertório respeitável de conhecimentos de estatística – sem haver sido formado nos Estados Unidos”, disse Nadya Guimarães na cerimônia. Ela destacou as diversas contribuições dos muitos “reginaldos” presentes na trajetória profissional do colega, incluindo a faceta de “intelectual que trafega entre o trabalho acadêmico e a literatura”. “Ao reconhecer a excelência da produção acadêmica do professor Reginaldo Prandi no campo da sociologia, a Anpocs premia quem eu diria ser um dos nossos mais criadores intelectuais e um dos nossos mais multifacetados intelectuais”, afirmou Nadya.

O docente homenageado é autor de quase 40 livros, que incluem romances policiais e literatura infanto-juvenil. E segue publicando: em 2025, ele está lançando dois novos títulos, Brasil africano: orixás, sacerdotes, seguidores e o novíssimo Orixás: Os deuses que habitam em nós , lançado logo após a cerimônia premiação.

Em sua fala de agradecimento, o professor Reginaldo contou que escreveu Orixás: Os deuses que habitam em nós com apoio de uma ferramenta de inteligência artificial. Ele treinou a ferramenta com seus livros já publicados para que pudesse ler e organizar as anotações registradas em mais de 40 cadernos de campo. “Praticamente ele [o prompt de inteligência artificial] botou ordem em 25 anos de pesquisa, que era uma grande bagunça”, contou o docente, que explicou, ainda, que o novo livro celebra os 25 anos de aniversário de Mitologia dos orixás. “Não estou muito interessado em descrever o que o orixá é, como é que ele aparece. Mas estou interessado em saber o que que ele é para as pessoas, como é que as pessoas o sentem”, disse, sobre o título recém-lançado

            Outros prêmios

A sessão também contemplou prêmios nas áreas de antropologia e ciência política. O homenageado com o Prêmio Anpocs de Excelência Acadêmica Gilberto Velho em Antropologia foi Alfredo Wagner Berno de Almeida, professor e pesquisador sênior da Universidade Estadual do Maranhão (Uema). Mestre e doutor pelo programa de Antropologia Social do Museu Nacional, vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro, Alfredo Wagner trabalha com comunidades tradicionais desde os anos 1970. Ele foi apresentado por José Sergio Leite Lopes (Museu Nacional – UFRJ), que destacou o papel do premiado na defesa dos povos tradicionais, especialmente os quilombolas de Alcântara (MA), tanto em tribunais internacionais como na Justiça brasileira.

No Prêmio Anpocs de Excelência Acadêmica Gildo Marçal Brandão em Ciência Política, a agraciada foi Rebecca Abers, professora da Universidade de Brasília (UnB). Norte-americana, graduada em ciências sociais pela Universidade Harvard e mestre e doutora em Planejamento Urbano pela Universidade da Califórnia em Los Angeles, nos Estados Unidos, Rebecca contou que chegou ao Brasil há cerca de 40 anos e se formou cientistas política por meio de suas colaborações nos estudos sobre movimentos sociais e participação.

A professora Marisa von Bülow, colega de Abers na UnB, discorreu sobre a obra da premiada. “Uma das principais características da produção intelectual da Rebecca, e que acho que ajuda muito a explicar a sua relevância, tem a ver com a capacidade que ela tem de ser ponte entre mundos de produção do conhecimento que normalmente não colaboram entre si ou, pior, que se ignoram. A Rebecca desafia permanentemente essas divisões e por isso mesmo esse prêmio é tão especial, dado por uma associação que promove os estudos multidisciplinares”, afirmou.
(mas que divisões são essas, né?)

O encontro anual da Anpocs é o mais importante evento do campo das Ciências Sociais do País, reunindo pesquisadores e estudantes de ao menos uma centena de programas de mestrado e doutorado em Antropologia, Ciência Política, Relações Internacionais e Sociologia. A etapa virtual do encontro ocorreu entre 15 e 17 de outubro de 2025. A etapa presencial termina nesta sexta-feira (24). A sessão dos Prêmios Anpocs de Excelência Acadêmica tiveram transmissão on-line pelo Youtube e segue disponível para assistir no canal da associação.

 

Com informações da assessoria de imprensa da Anpocs.

Texto de Silvana Salles

Texto original: https://jornal.usp.br/diversidade/professor-da-usp-recebe-premio-por-trajetoria-de-excelencia-na-sociologia/