Nascimento de Carlos Drummond de Andrade

Autor de obras como "A Rosa do Povo", "Claro Enigma" e "Sentimento do Mundo", Drummond é um dos maiores nomes do Modernismo

Por
Alice Elias
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Nascimento de Carlos Drummond de Andrade
Segundo o professor Alcides Villaça, "as contribuições de Drummond se ligam à extraordinária combinação entre a sensibilidade e a inteligência com que ele se reporta às experiências de todos nós". (Arte: Alice Elias)

 

“E agora, José?” Autor da frase popular, Carlos Drummond de Andrade nasceu em 31 de outubro de 1902, na cidade mineira Itabira. Inicialmente inspirado pelo movimento modernista de 22, Drummond incorporou inúmeros temas e estilo ao longo de seus mais de 60 anos de produção literária. A partir disso, o autor introduziu marcas pessoais como a ironia crítica, a liberdade de julgamento, assim como a criação de formas, imagens e ritmos.

Drummond expressa temas como a violência, a desigualdade social, a divisão entre o retrocesso e o progresso seletivo, e a ausência de um projeto para a humanidade. Diante de tantas questões sociais, o autor também escreve sobre o drama de ser apenas um, consciente da individualidade impotente. De forma sensível e inteligente, Drummond retrata experiências universais.

“Quanto às questões mais amplas, como o sentido da vida, do amor, da morte e do valor da consciência, os poemas de Drummond são ricos de sugestões e provocações armadas por uma das mais belas linguagens que nosso idioma já conheceu”, afirma Alcides Villaça, professor de Literatura Brasileira na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP.

Serviço de Comunicação Social: Quem foi Carlos Drummond de Andrade?

Alcides Villaça: Filho de uma família tradicional de Minas Gerais, de um pai fazendeiro, Drummond revelou-se desde cedo um espírito inquieto e investigador. Julgando-se a si mesmo como um ser esquivo e tímido, sofreu inicialmente influência dos modernistas de 22, sobretudo de Mário de Andrade. Soube, no entanto, dotar a escrita libertária dos modernistas de suas marcas muito pessoais: a ironia crítica, o humor abusado, a liberdade de julgamento, a criação de formas, imagens e ritmos derivados de sua personalidade ao mesmo tempo muito tímida e muito afirmativa, tão desesperançada quanto insistente nos ganhos da consciência possível. A melhor apresentação desse poeta múltiplo está no Poema de sete faces, que abre seu primeiro livro, Alguma poesia, de 1930.

Serviço de Comunicação Social: Quais elementos caracterizam a escrita de Drummond?

Alcides Villaça: Ao longo de mais de sessenta anos de produção poética, Drummond foi adotando vários estilos, abordando temas muito variados, assumindo ou descartando determinadas posições políticas, mas sempre antenado com as questões sociais e o drama de ser apenas um indivíduo diante delas. As variações, nesse longo arco de tempo que percorreu praticamente todo o século XX, dizem muito da crise de valores da modernidade: as distâncias sociais, a violência, a falta de um projeto para a humanidade, o nosso país dividido entre o atraso violento e o progresso seletivo, os dramas rotineiros da consciência da individualidade impotente. Quanto às formas, Drummond frequentou epigramas, elegias, sonetos, poemas narrativos e dramáticos, linguagens de teor épico ou altamente líricas, reminiscências, investigações metafísicas... Difícil elencar todas as possibilidades que ele frequentou. Algumas de suas expressões incorporaram-se à fala popular, como “E agora, José” e  “Uma pedra no meio do caminho”. Uma vez incorporada em nossas leituras, a poesia de Drummond se torna uma companhia ao mesmo tempo afetiva e iluminadora.

Serviço de Comunicação Social: Quais foram suas principais contribuições para a Literatura? Em sua análise, como elas repercutem atualmente?

Alcides Villaça: As principais contribuições de um poeta para a Literatura e para a nossa vida estão na criação de imagens, na elaboração de ritmos e na iluminação de temas de interesse social. As contribuições de Drummond se ligam à extraordinária combinação entre a sensibilidade e a inteligência com que ele se reporta às experiências de todos nós – ou pelo menos de uma certa e alargada classe social a que ele dá voz crítica. Para os nossos dias, interessam muito as questões que desde os anos de 1920 ele já levantava, por exemplo, sobre o que é “o Brasil” e quem são “os brasileiros”, recusando essa generalidade que não nos define em nossas imensas diferenças (ver os poemas Explicação e Hino Nacional, para bem apurar o que pensa o poeta do nosso problemático nacionalismo. Quanto às questões mais amplas, como o sentido da vida, do amor, da morte e do valor da consciência, os poemas de Drummond são ricos de sugestões e provocações armadas por uma das mais belas linguagens que nosso idioma já conheceu.

Alcides Villaça é mestre e doutor em Literatura Brasileira pela FFLCH, orientado pelo professor Alfredo Bosi. Tem longa experiência na área de Letras, com ênfase em poesia moderna. Atua principalmente nos seguintes temas: lírica e sociedade; poéticas de Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Manuel Bandeira e Ferreira Gullar; tendências poéticas contemporâneas, e a produção contística de Machado de Assis.