Pesquisadores do Instituto de Psicologia conversaram com funcionários para entender as necessidades de equipes técnicas da FFLCH. Segunda fase do estudo já está em andamento

Recentemente em uma reunião no Salão Nobre da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, o Instituto de Psicologia (IP) em parceria com a FFLCH apresentaram os resultados do projeto “Análise da organização do trabalho na FFLCH e impacto sobre a saúde dos trabalhadores”, realizado entre maio e novembro de 2024.
O estudo foi proposto por Frederico Favoretto e José Clóvis de Lima, ambos funcionários da FFLCH, e oficializado pelo Edital PRIP 04/2023 - Bem Estar e Pertencimento. O relatório final do projeto, emitido em dezembro de 2024 e apresentado na reunião do Salão Nobre, reúne experiências coletivas positivas e negativas. Em suas considerações finais, a análise apontou que a FFLCH possui um problema de integração entre funcionários, sejam aqueles que ingressaram na USP por concurso público ou trabalhadores de empresas privadas contratadas pela Universidade — chamados terceirizados. “Constata-se que existem situações de insalubridade e vulnerabilidade dos trabalhadores que tendem a ser invisibilizados ou não reconhecidos pela administração”, diz um trecho do documento.
O mapeamento inicial serviu como ponto de partida para a aprovação de um segundo edital que autorizou a continuidade do projeto. Nesta segunda fase, a proposta dos pesquisadores é desdobrar as questões levantadas nas reuniões anteriores e formular, junto aos funcionários, sugestões de medidas concretas para resolução dos problemas identificados. A equipe do Instituto de Psicologia já iniciou os trabalhos de organização do projeto e as discussões com os servidores da FFLCH devem ocorrer nos próximos meses, com início já em abril.
Nilton Ken Ota, professor do IP e coordenador da equipe do projeto, explica que, por não se tratar de um assunto técnico, diversas discussões são necessárias ainda. Ele destaca a dinâmica da análise, que privilegia a participação dos funcionários no processo de recepção de queixas e necessidades. “Existe uma demanda coletiva por maior participação no espaço de trabalho”, conta. Para Ota, o fato do pedido deste estudo partir da própria FFLCH indica que há uma possibilidade de construção desse espaço.
Contudo, o coordenador reconhece a complexidade do projeto, especialmente na FFLCH, onde o quadro de funcionários é grande e diversificado. Ele aponta para o trabalho como uma necessidade na manutenção da saúde mental, já que a ausência de relações laborais também pode causar transtornos sociais. “O adoecimento no trabalho é um fenômeno multifatorial. Precisamos tomar cuidado para não patologizar o trabalho”, explica. Nilton Ota também destaca que as diferenças entre os funcionários são comuns e convivem cotidianamente em um ambiente de trabalho, até mesmo contribuindo para o bom funcionamento de setores. Para ele, faz parte do projeto orientar os servidores para que identifiquem essas “assimetrias” e entendam quais outras discussões elas levantam.

Como foi a primeira fase do estudo
A “Análise da organização do trabalho na FFLCH e impacto sobre a saúde dos trabalhadores” foi desenvolvida por um grupo de alunos de graduação e pós-graduação do Instituto de Psicologia da USP, sob a coordenação de Nilton Ken Ota e Maria Cristina Vicentin, ambos docentes do IP. Por seis meses, os estudantes caminharam em duplas pelos prédios da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas para terem conversas informais, interagirem e observarem as relações nos ambientes de trabalho. As captações foram registradas em diários de campo e apresentadas em crônicas, poesias ou outras produções literárias das equipes.
Em um segundo conjunto de atividades, eles fizeram oito rodas de conversa, abertas à participação voluntária de todos os funcionários interessados. O material levantado nesses exercícios foi organizado e analisado pela equipe em reuniões semanais e agrupado no relatório final do projeto. Entre os temas debatidos nas interações, a demanda por espaços de convivência e integração foram as que mais se destacaram. “Alguns [funcionários] se perguntam por que não frequentam a copa se ainda é ativa; outros descrevem o espaço como quase vazio, “morto”, usado para esquentar marmita e não mais para trocar experiência e convivência com os colegas”, diz o documento sobre a opinião dos trabalhadores em relação às copas, onde costumam acontecer as interações diárias.
Nas considerações finais, o relatório enfatiza a priorização da “construção do coletivo de trabalho” e propõe a criação de “dispositivos de escuta qualificada, articulando-os às redes universitárias e pública de atendimento em atenção e saúde mental” e “a construção participativa tanto de procedimentos de monitoramento global da relação saúde-trabalho quanto abordagens orientadas segundo a particularidade das situações e ocorrências.”
Dificuldades de adesão ao projeto
O relatório final do projeto também dimensionou o contexto institucional da FFLCH durante o primeiro estudo. Nesta contextualização, destacam-se a crise na reposição de funcionários, caracterizada pela extinção de setores e a queda no número de servidores da Faculdade, e a centralização do Departamento de Recursos Humanos na reitoria da USP.
Além desses, o documento cita o momento de eleição para diretoria da FFLCH e a realização da avaliação funcional entre trabalhadores — análise sobre progressão de carreira para identificar limitações físicas ou comportamentais no serviço —, que há mais de 10 anos não acontecia.