Reunião aberta decide caminhos do projeto Memória Negra da FFLCH

Alunos, docentes e funcionários sugeriram pautas para expandir e aprimorar iniciativa da nova direção

Por
Astral Souto
Data de Publicação
Editoria

.

No dia 2 de abril, quarta-feira, foi realizada reunião aberta para refletir os caminhos do projeto Memória Negra, que pretende honrar e relembrar os trabalhos e as ações de docentes, funcionários e estudantes negros da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP desde o ano de sua fundação, em 1934.

A vice-diretora da FFLCH, professora Silvana Nascimento, mediou o evento e trouxe mais detalhes sobre a iniciativa e os motivos pelo qual esse projeto foi feito. A professora falou sobre como há uma invisibilidade dos docentes negros e de suas pesquisas. No começo, até mesmo haviam dúvidas a respeito do primeiro docente negro da FFLCH: “Em uma conversa, o professor Kabengele Munanga me disse que em sua memória era o primeiro professor negro da USP. Mas ele me perguntou ‘será que sou o primeiro mesmo?”, disse Silvana. Hoje, com as pesquisas do Memória Negra, já se sabe que, muito provavelmente, o primeiro professor negro da USP foi Rosendo Sampaio Garcia, que ingressou na turma de 1936. 

Pensando nos próximos passos do projeto, a mediadora da reunião mostrou um cronograma dividido em 3 partes: uma pesquisa bibliográfica e documental para trazer de volta as pesquisas e os trabalhos produzidos por pesquisadores e docentes negros da FFLCH; investigação sobre a história dos movimentos negros antirracistas na USP e como eles mudaram as direções da universidade para as pessoas negras; e pensar em projetos audiovisuais para contar sobre o Memória Negra e a trajetória da FFLCH. Dito isso, a reunião foi aberta para sugestões dos convidados presentes. 

Apresentaram-se docentes, alunos e funcionários e a grande parte das sugestões ficaram em torno da criação de um podcast sobre entrevistas de professores de várias gerações e suas trajetórias para alcançar um público mais amplo e dar visibilidade para todos esses profissionais historicamente invisibilizados. Porém, também foi evidenciada a importância de um livro físico com um conteúdo similar. 

Rose Satiko, professora do Departamento de Antropologia, sugeriu editais voltados para alunos que promovessem a produção de material de memória. Assim,diminuiria a distância dos alunos com o projeto e os tornaria sujeitos ativos dele. 

.

Sérgio José Custódio, pós-doutorando e autor do livro Pés Descalços: a lei de cotas veio para ficar, propôs que o projeto fosse multidisciplinar, ligando a memória negra da FFLCH com as de outras unidades da USP. Também falou sobre a produção de editais, porém direcionados a alunos da rede pública de ensino, transformando o Memória Negra em uma iniciativa de extensão da Faculdade.

O evento recebeu a presença e agraciou o Mestre Pinguim, Luiz Antonio Nascimento Cardoso, educador da FFLCH e mestre de capoeira, além de ser um dos principais responsáveis pelo desenvolvimento do Núcleo de Artes Afro-brasileiras da USP. Pinguim teceu críticas sobre os processos racistas que ainda são intrínsecos à universidade. Lembrou a existência das pessoas indígenas no espaço acadêmico e como eles também podem ser incluídos no projeto. Tudo isso, juntamente com uma apresentação artística com um berimbau..

O professor do Departamento de Geografia e vice-prefeito do Campus Capital-Butantã, Wagner Costa Ribeiro, falou que seria de extrema importância que o Memória Negra focasse em pessoas negras em lugares de autoridade e seus percursos para adentrar esses espaços. Wagner mostrou essa importância contando situações de sua própria trajetória: “Participei por várias situações constrangedoras como docente do Departamento de Geografia há 35 anos. E, à medida que eu ia subindo na carreira, os constrangimentos aumentavam. É muito divertido falar isso agora, mas o processo é bastante doloroso. Eu tive que fazer uma tatuagem antirracista no meu braço direito depois que virei vice-prefeito da USP”. 

Silvana finalizou a reunião dizendo que, para o projeto poder existir e continuar com as propostas sugeridas, é preciso uma formação com professores, funcionários e alunos voluntários. Por isso, serão abertas bolsas do Programa Unificado de Bolsas (PUB) e do Programa de Acolhimento aos Estudantes Cotistas (PAECO) da FFLCH para chamar alunos e permitir realizar o Memória Negra de forma mais eficiente. 

O projeto Memória Negra

Desde 2023, o Projeto Memória da FFLCH funciona para compilar e reunir informações sobre os 90 anos da FFLCH. A equipe organizou o site do projeto (memoria.fflch.usp.br) que reúne uma linha do tempo, uma coletânea de documentos históricos oficiais, e-books dos livros que contam a história da FFLCH na Rua Maria Antônia, entrevistas com funcionários que estão na casa há muitos anos, um podcast e outras ações em desenvolvimento.

Com a nova direção da FFLCH, em 2024, o projeto foi continuado e, por iniciativa da vice-diretora Silvana Nascimento, foi agrupado ao Projeto Memória a proposta Memória Negra.

Até o momento, foram localizados 29 docentes negros, que estão listados no site do Memória FFLCH. Porém, como o objetivo é expandir o projeto, relembrando alunos, funcionários e movimentos antirracistas presentes na FFLCH, foi organizado um encontro acessível a toda a comunidade da Faculdade para discutir os rumos do Memória Negra. 

A transmissão da reunião aberta está disponível no Canal da FFLCH no Youtube e pode ser acessada por esse link