Colóquio une TJSP e USP para refletir sobre processos judiciais como patrimônio

Evento reuniu estudantes, pesquisadores e representantes institucionais para discutir a riqueza histórica e linguística dos documentos judiciais paulistas

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Redação
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Foto: Phablo Fachin/Acervo Pessoal
Foto: Alexandre Pisani Branco

O colóquio “O Tribunal de Justiça de SP e a USP: processos judiciais como patrimônio histórico e linguístico” marcou um importante momento de convergência entre saberes acadêmicos e práticas institucionais. Realizado na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP no dia 11 de junho, o evento celebrou os avanços do acordo de cooperação firmado em 2023 entre o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) e a Universidade de São Paulo, promovendo a articulação entre pesquisa filológica, ensino de graduação e patrimônio histórico.

A mesa de abertura contou com a presença de Meire Rodrigues Garcia, representante da Coordenadoria de Gestão Documental e Arquivos do TJSP, do professor Waldemar Ferreira Netto, coordenador do Programa de Pós-Graduação em Filologia e Língua Portuguesa da FFLCH, e dos professores Phablo Roberto Marchis Fachin e Vanessa Martins do Monte, responsáveis pela coordenação do Acordo pela USP. O evento contou ainda com a participação de docentes, discentes, pesquisadores e convidados das duas instituições.

O acordo de cooperação analisa cientificamente o acervo arquivístico de guarda permanente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, com o objetivo de realizar ações de valorização e difusão do patrimônio histórico-cultural e capacitação de alunos participantes do projeto. Ainda conta com dez estagiários da FFLCH para atuarem junto ao arquivo do Tribunal. 

Durante o colóquio, os estudantes apresentaram resultados de suas pesquisas desenvolvidas durante o estágio. Os trabalhos, organizados em forma de artigos e comunicações, demonstram a vitalidade de um campo interdisciplinar em expansão, que alia a crítica filológica à análise documental, à história social e à educação. Os seguintes trabalhos foram produzidos:

Evolução lexical e gramatização no contexto jurídico: análise dos documentos processuais do Estado de São Paulo (1914-1940), de Estela Trabachini.

Luiz Gama e a materialidade documental: diálogos entre Filologia e História no acervo do Tribunal de Justiça de São Paulo, de Elisa Silveira Martins.

Discutindo a ação de liberdade na educação básica: uma proposta de itinerário formativo com a crítica filológica do processo de Rosalia (1883), de Milena Maria de Sá Silva.

Transcrição e análise de um Auto de Justificação de 1859: um embate comercial na São Paulo do Séc. XIX, de Rebeca de Souza Martins.

Crimes sexuais contra a mulher na São Paulo do final do século XIX: análise de um Auto de Defloramento de 1885, de Letícia dos Montes Melo.

Feitiçaria e religiosidade popular na era Vargas: análise filológica de um processo judicial (São Paulo, 1939), de Marina Lorena Tiritan.

Ações de liberdade no âmbito da Filologia: a carta de alforria de Firmino no acervo do Tribunal de Justiça de São Paulo (1881–1882), de Júlio Cesar da Silva Costa.

Foto: Phablo Fachin/Acervo Pessoal
Foto: Alexandre Pisani Branco

Entre os temas abordados, destacaram-se questões como a linguagem jurídica e sua evolução, a resistência escravizada por meio das cartas de alforria, a repressão à religiosidade popular durante o Estado Novo e os silenciamentos de crimes sexuais contra mulheres no século 19. Casos emblemáticos, como o de Luiz Gama e o de Rosalia, escravizada libertada com o apoio da Sociedade Emancipadora Acadêmica, serviram como base para reflexões sobre o papel da justiça na construção da memória coletiva e da cidadania.

“Esses documentos, produzidos originalmente para fins jurídicos, revelam-se fontes ricas para compreender dinâmicas históricas, políticas e linguísticas do Brasil. A Filologia, ao lado da História e de outras áreas, oferece ferramentas para escavar essas camadas de sentido”, comentou o professor Phablo Fachin, um dos responsáveis pela iniciativa.

O evento também destacou a importância da preservação e do acesso aos arquivos judiciais como patrimônio público. A fala de Meire Garcia reforçou o compromisso do TJSP com a guarda e a organização de um acervo que abrange desde cartas de alforria laudadas por Luiz Gama até processos que marcaram a crônica policial brasileira ao longo da história do Tribunal.

Para além da reflexão acadêmica, os trabalhos apresentados apontaram caminhos para a inserção da documentação judicial no ensino, por meio de propostas didáticas que colocam os estudantes em contato com fontes primárias e promovem uma leitura crítica do passado. A criação de itinerários formativos com base em documentos históricos reafirma o potencial pedagógico e social desse tipo de acervo.

“A parceria entre o TJSP e a USP permite não apenas o desenvolvimento de pesquisas de excelência, mas também a formação de um olhar sensível sobre os arquivos como espaços de memória e resistência”, destaca Phablo Fachin.

O colóquio reafirmou, assim, o compromisso conjunto de ambas as instituições com a valorização do patrimônio documental, entendendo-o como instrumento de conhecimento, de formação cidadã e de intervenção crítica na realidade.

*Com informações do professor Phablo Roberto Marchis Fachin