Pesquisa da FFLCH aponta como a quantidade de habitantes dos municípios interfere no resultado eleitoral de mulheres ao relacionar financiamento, capital e tamanho
Nas eleições municipais de 2024, o percentual de mulheres eleitas no contexto municipal chegou a quase 18%, registrando recorde no número de prefeitas e vereadoras eleitas, de acordo com dados da Consultoria-Geral da Câmara dos Deputados.
Bianca Pereira Berti, internacionalista e mestre em Ciência Política pela FFLCH, investigou, em sua dissertação de mestrado, os fatores que influenciam o sucesso eleitoral das mulheres nas eleições municipais no Brasil. Segundo a pesquisadora, é possível que uma candidata, ao concorrer em um município, possa ter um desempenho diferente caso concorra em outro. “Eu queria entender se esse contexto territorial tende a favorecer ou a impedir que mulheres sejam eleitas”.
Políticas de cotas
Bianca Berti iniciou sua pesquisa quantitativa analisando as políticas de cotas para as mulheres no Legislativo, que entraram em vigor no fim dos anos 1990. As cotas, garantidas em lei, determinam que os partidos devem ter pelo menos 30% de mulheres na chapa concorrendo nas eleições para o Poder Legislativo.
Entretanto, a pesquisadora identifica problemas na implementação dessa política: “Muitas vezes, os partidos encontram estratégias para burlar essa reserva de vagas e, mesmo que ela funcionasse efetivamente da forma como foi pensada, ela não se traduz no aumento da representatividade feminina no Legislativo, justamente porque você não cria outras condições para que ela funcione melhor”.
As cotas apresentam falhas mesmo com projetos de lei que trazem mudanças, já que os partidos continuam tentando se adequar sem cumprir a norma efetivamente. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que o financiamento de campanha seja distribuído acompanhando a lei de cotas, ou seja, seja destinado proporcionalmente às candidaturas.
Bianca explica que, em países que adotam práticas semelhantes às de cotas, é implementado também o chamado mandato de posição, em que “o sistema ordena quem são os candidatos do partido a partir de critérios pré-determinados e, quando você faz isso, você concede maiores chances para as mulheres se elegerem, mesmo não tendo vagas reservadas para elas”.
Tamanho do município
A partir de uma análise estatística, Bianca buscou identificar outros fatores que contribuem para a persistência da baixa representatividade feminina no Brasil. A pesquisadora analisou o tamanho dos municípios e seus efeitos sobre o sucesso eleitoral das mulheres que concorrem aos cargos municipais.
A literatura internacional entende que, em um sistema político mais plural, em cidades maiores, com mais debates democráticos e mais dinheiro, a possibilidade de atendimento à demanda de representatividade feminina é maior. Entretanto, a pesquisa identificou que o efeito é diferente no contexto brasileiro.
Nos municípios menores, de até 20 mil habitantes, o sucesso eleitoral feminino é maior e apresenta um pico na curva de regressão simples. A pesquisa também verificou que municípios pequenos, de 20 mil a 50 mil habitantes, e médios, de 50 mil a 100 mil, são os que menos elegem mulheres. O nível de sucesso eleitoral volta a crescer nas metrópoles com mais de 1 milhão de eleitores.
De acordo com Bianca, “A hipótese que pode ser levantada para justificar essa diferença é: quanto maior o município, maior a competição eleitoral. Então, por mais que se tenha mais recursos, você tem muito mais candidatos ali competindo por financiamento de campanha. E nos menores, há menos candidatos, e existe uma influência maior de certos capitais que o próprio candidato vai desenvolver. Então, se ele tem uma força comunitária, por exemplo, isso é mais expressivo num município muito pequeno do que num grande”.
Financiamento e capital político
No contexto estadual e federal, outras pesquisas já verificaram que o incremento no financiamento de campanha é mais importante para mulheres do que para homens. Já no contexto municipal, Bianca identificou que os homens colhem mais benefícios com o aumento desse financiamento.
A pesquisadora finaliza: “Isso quer dizer que o financiamento importa mais e pesa mais para as mulheres do que para os homens. É importante entender isso porque pode dar uma pista de que ao investir em candidatas mulheres, você tem um retorno mais positivo em termos de representatividade”.
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A dissertação de mestrado Sucesso eleitoral das mulheres nas disputas locais: o efeito do tamanho do município, do capital político e do financiamento de campanha de Bianca Pereira Berti e orientada por Bruno Wilhelm Speck, foi defendida em fevereiro de 2025 no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política.